VERSO, POESIA E ESTÉTICA, por Wilson Rocha

O texto abaixo foi encontrado enquanto acompanhava as postagens dos leitores na página do Literatortura. Me encantei com este ensaio sobre a construção da poesia e seu papel na sociedade. Wilson Rocha escreveu este artigo para o jornal “A Tarde”, de Salvador, Bahia. Meus agradecimentos à leitora Rrose Selavie por compartilhar este texto! Espero que os leitores do blog, assim como eu, se encantem e espalhem esse ensaio, escrito com tanta maestria.

“A condição essencial da subjetividade lírica depende antes de tudo do domínio da arte poética, da técnica de versificação, que comporta uma forma estrutural em que o mundo sensível, a interioridade e individualidade poética, ou estilo, possam mais facilmente submeter-se às formas teóricas que a arte exige, pois a estética, mais que uma necessidade, é uma exigência acima de tudo. Todos sabem que neste mundo sempre há quem escreva versos sem ser poeta. E também – como disse Tomachevski – que a língua vulgar contém tudo o que está na poesia, menos poesia.

Na era tecnológica em que vivemos, a decadência da vida civilizada está exaurindo a arte e secando as fontes da criatividade e da vida espiritual do homem. Por isso o conceito de poesia está morrendo na alma do homem contemporâneo, que parece estar-se voltando para a vida tribal e fixando-se no psiquismo consumista, na irracionalidade do drama ecológico e na imensa e indomável economia das drogas.
Os poemas atualmente produzidos são quase sempre meros atentados contra a língua e a estética, sobretudo em um país provinciano e tradicionalmente iletrado como o nosso onde os pequenos literatos são tão abundantes e televisivos e os poetas se confundem com os fazedores de modinhas, como se a poesia fosse algo tão banal, descartável e massiva como a música popular.
Na conjuntura intelectual da Bahia, onde já não se vêem atualmente jovens poetas eruditos como Jair Gramacho, é reconfortante vislumbrar, contudo, algum brilho na produtividade de uns raros poetas emergentes, como, por exemplo, Carlos Loria, que prestou recentemente um valioso serviço às letras do nosso meio ao traduzir com perícia e brilho todo o fascínio, a magia e o lirismo genial de um dos maiores poetas do século, o norte-americano Edward Estlin Cummings (1894-1962). Além de poeta dotado de forte vocação lírica e bom tradutor, Carlos Loria é um artífice consciente das dificuldades. O seu ofício e seus livros, elegantes e agradáveis, são de boa categoria gráfica, como se vê em Cummings 20 Poemas, edição Código, Salvador, 1990; Casa Clara, Código, 1991, e Territor, Edições Audience of One, Salvador, 1993, ambos de excelente qualidade, poesia marcada pelos sinais pungentes da existência do homem, as cores e os eflúvios do cotidiano, a sombra e a memória da criatura e de seus objetos. Acontecimento sobretudo significativo é a sua tradução dos poemas de Cummings.

any man is womderful
and a formula 
a bit of tobbacco and gladness
plus little derricks of gesture

(todo homem é um assombro
e uma fórmula
um pouco de tabaco e júbilo
e um que outro ademane)

Poesia atenta aos rumores e visões que a cercam, que se procura intimamente, obsessivamente buscando novos caminhos, hesitante entre vanguardismo e uma longínqua descendência surrealista, a voz poética de Almandrade (Antonio Luiz M. Andrade), também arquiteto e artista plástico, já com obras publicadas, caracteriza-se por uma dramaticidade não longe nem isenta das grandes preocupações vivenciais do homem contemporâneo, como se vê em seu último livro, Arquitetura de Algodão, onde se encontra esse instante de puro lirismo:

Quando vem
a noite
corro atrás
do sono
na certeza
talvez
de encontrar
tua imagem
no sonho.

A força da poesia está no súbito confronto do espírito do homem com o desconhecido, com o impacto da visão daquilo que não existia antes.”

Wilson Rocha (1921 – 2005)

As travessuras de Mario Vargas Llosa.

Eu adoro literatura, sou uma devoradora de livros que dentro dos conceitos de uma religião budista posso ter sido um traça no passado. Numa de minhas aventuras pelo mundo fascinante da literatura está o contato com autores da América Latina, e um deles, ao qual me encantei, é o vencedor do Prêmio Nobel, o escritor peruano Mario Vargas Llosa.

Conheci essa joia literária em minhas aventuras pelo mundo dos blogs. Foi lendo uma coisa aqui e ali, que me senti numa força adorável de sair da minha toca de escritora e ir para uma livraria, o que convenhamos, não é lá muito difícil, tendo em vista nosso perfil. Isso é fenomenal, e sabe por quê? Por que mostra que uma leitura em poucas linhas pode nos influenciar a querer algo, isso é uma arte, falam tanto da tal “lábia”, e isso é fato, ela está aí para comprovar.

Cheguei à livraria, dei o título ao vendedor e pronto! Lá estava eu, alegre e saltitante, com meu primeiro contato com a “coisinha à toa”, apelido carinhoso da Menina Má para o protagonista Ricardo Somocurcio, peruano, que trabalha como tradutor da Unesco. Dizem que o livro tem fundos autobiográficos do autor, mas vamos pensar qual autor que não tem palavras impressas do seu eu, aquele tom íntimo, que apesar de estar lá escrito aos olhos dos leitores, só ele realmente sabe dizer qual o limite da realidade daquilo? Costumo dizer que escrever exige apenas uma musa inspiradora, tem gente que têm várias, mas digo que a musa de todo escritor ou escritora, é a Vida. Costumamos usar nossos Amores como “musos” ou “musas”, mas nossos amores fazem parte da vida, logo penso que não somos imorais, tal como Lord Henry de Oscar Wilde dizia em “O retrato de Dorian Gray”:

 “Toda inspiração é Imoral (…)”.

Tão logo, o questionamento se “Travessuras de uma Menina Má” é ou não autobiográfico, não nos traz a questão. Quem sabe um dia, isso venha à tona? Bom, vamos voltar ao enredo do livro… Ricardo Somocurcio conheceu a Menina Má no bairro de Miraflores, na capital do Peru. E começa então a desenvolver a trama, que passa em vários locais do mundo: Peru, Paris, Inglaterra, Japão e por fim, Madri.  Ahhh e por que a personagem chama-se Menina Má?

Ela ganhou esse nome, pois desde que ela instalou-se no mundinho do personagem Ricardo, ela o virou das avessas. A estória do livro, sobretudo,vai além das faces do Amor.  São viagens pelos lugares onde os protagonistas vivem intensamente suas idas e vindas, todas as idealizações políticas-culturais dos anos 60,70 e 80. Temos o Peru na época da ditadura e guerrilhas, Paris e os anos 60, com seus revolucionários planejando as lutas armadas enquanto comem “croissant” nos cafés parisienses, pessoas lendo Hemingway nas mesmas cafeterias e visitando o museu do Louvre e o palácio de Versailles. Depois do universo romântico e idealista da Paris de Hemingway, o leitor passa a viajar no amor livre e lisérgico dos anos setenta. Os personagens que aparecem nessa época são extremamente cativantes, e certamente uma lágrima rolará até dos olhos do mais ogro leitor. Depois de toda a revolução amorosa vivida em Londres, Ricardito, o “bom menino” vai para o Japão, cultura oriental efervescente com o cenário da máfia japonesa, sob uma esfera de medo e muito ciúme. Depois da viagem ao oriente, vamos para a terra granada, dos touros ensanguentados, na intensa capital da Espanha, Madri. Nessa época, temos todo o contexto histórico dos anos 80: os conflitos políticos da Espanha totalitarista de Franco, e os primeiros filmes de Almodóvar.

Lily, a “Menina má”, que já vão conhecer logo nas primeiras páginas, é uma mulher de várias faces. Suas nuances se misturam nos personagens que ela cria, em cada país, todos eles com nomes diferentes. Neste romance, vivemos as múltiplas facetas de Lily, sentimos raiva, comoção e Amor pela personagem. Ricardo Somocurcio viveu anos apaixonado por Lily, mesmo com suas constantes idas e vindas e muito jogo sujo por parte de Lily, malvada, sedutora e misteriosa. É um livro que me fez pensar nos grandes encontros e desencontros da vida, e que o Amor pode ultrapassar barreiras, mesmo ele sendo tão “não-convencional”, fugindo de todo padrão. Sobretudo, vimos ali em tons dignos de Woody Allen e Pedro Almodóvar, que creio eu diretores perfeitos para um filme inspirado nesta obra de Llosa. Um livro intenso, que nos faz sentir e vivenciar em trezentas e duas páginas, todo o furor e intensidade de três décadas, e sim, nos faz ver a verdadeira face do Amor, pintadas em linhas sobre as personalidades múltiplas de Lily e toda a paciência, compreensão e esperança do “coisinha à toa” Ricardo, que como tradutor e intérprete, nutre pela Menina Má e travessa,  um Amor tão intenso digno de um romance. Eis aí o presente de Vargas Llosa para nós, leitores. Mario foi Vencedor do Prêmio Nobel, Prêmio Cervantes (grande prêmio da literatura em língua espanhola) e laureado como Príncipe das Astúrias, ao lado de outros gênios da arte e cultura, tal como Oscar Niemeyer, Woody Allen, Pedro Almodóvar, Paco de Lucía e Bob Dylan.

Mario Vargas Llosa pode ser muito do seu personagem Ricardito, mas temos certeza que ele não é um “coisinha à toa”, mas certamente, um bom menino, que muito enalteceu as letras latino-americanas.

“Uma tarde, sentados no jardim, ao crepúsculo, ela me disse que se algum dia eu pensasse em escrever a nossa história de amor, não a deixasse muito mal, senão o seu fantasma viria me puxar os pés todas as noites.

– E por que pensou isso?

– Porque você sempre quis ser escritor e nunca teve coragem. Agora que vai ficar sozinho, pode aproveitar, assim esquece a saudade. Pelo menos, confesse que lhe dei um bom material para escrever um romance. Não foi, bom menino?”

 

 

Ansiedade e os moinhos de vento.

Tenho em mim todos os sonhos do mundo.

(Fernando Pessoa)

Ser ansioso é ser idealista, é ter pressa, das coisas acontecerem, pressa da chuva passar rápido e colocar-se a correr nu pelas calçadas da cidade de pedra. Digo correr nu, porque pessoas ansiosas vivem constantemente nuas, são pessoas intensas, mesmo aquelas imersas na timidez, que não se permitem sair da toca, por medo de serem julgadas, mas que todas as noites, muitas vezes insones, coloca-se a pensar no tripé “E se”, “Será”, “Quando”. E então imaginamos um turbilhão de possibilidades para o nosso mundinho, um milhão de situações em que imaginamos nossos castelinhos de areia construídos de maneiras diferentes, e sempre nos cobrando por castelos perfeitos que nunca sejam destruídos quando a marola chegar. Às vezes é uma marola tão mansa, tão calma, que apenas molha nossos pés, mas nós a vemos como um maremoto prestes a engolir uma linda cidadezinha litorânea.Eu costumo citar o Dom Quixote, um fidalgo que confunde inofensivos moinhos de ventos com dragões enormes, e vale lembrar que hoje, as Dulcinéias é que matam seus próprios dragões, talvez pela pura ansiedade nossa, das mulheres, de tomarmos um passo à frente e ficar roendo as unhas ou comendo barras infinitas de chocolate Talento.

"Sonhar o sonho impossível, Sofrer a angústia implacável, Pisar onde os bravos não ousam, Reparar o mal irreparável, Amar um amor casto à distância, Enfrentar o inimigo invencível, Tentar quando as forças se esvaem, Alcançar a estrela inatingível: Essa é a minha busca." Miguel de Cervantes, Dom Quixote de La Mancha
“Sonhar o sonho impossível,
Sofrer a angústia implacável,
Pisar onde os bravos não ousam,
Reparar o mal irreparável,
Amar um amor casto à distância,
Enfrentar o inimigo invencível,
Tentar quando as forças se esvaem,
Alcançar a estrela inatingível:
Essa é a minha busca.” Miguel de Cervantes, Dom Quixote de La Mancha

E assim vamos levando nossos dias, nós pessoas ansiosas, que sempre queremos o aqui o agora, que nos aborrecemos com o fracasso, com conclusões precipitadas, queremos nossos ideais realizados da noite para o dia. Nós planejamos para ontem, e quando nosso escopo de vida se atrasa, nos martirizamos por não ter chegado e fincado nossas espadas de aço no coração de nossos dragões, que são nossos medos, angústias, sonhos, amores, e até a tão cruel e desnecessária vingança. Temos pressa e ouvir e ser ouvidos. Temos pressa de Amar e sermos correspondidos. Esperamos um telefonema que nunca chega, uma conversa que nunca nos chama, esperamos sempre por algo que nos faça sair da toca, algo para dividirmos nossa tão esfomeada ansiedade. Entramos embaixo do chuveiro cinco horas da amanhã, e já pensamos nas cinco horas da manhã do dia seguinte, olhamos nossa cara amassada no espelho e já imaginamos as olheiras do dia seguinte. Construímos nossas estruturas em cima de uma base, e estamos sempre torcendo para nossa base nunca desmoronar. E quando ela desmorona, no dia seguinte já queremos nossas estruturas abaladas novamente no lugar. Por quê?Pra que tanta pressa?Nós pessoas Ansiosas, estamos sempre correndo contra as areias do tempo, nossa calma esvazia-se em poucos segundos, mas muitas vezes escondemos nossa falta de calma em um rosto sereno e dissimulado, deixamos nossas emoções desafloradas dentro de um vaso guardado num armário à sete chaves, dentro de nossa bolha de proteção. É o medo de sermos julgados, de ver nossos anseios jogados no lixo, como uma estratégia mal feita em um jogo de xadrez. E talvez, esses nossos atos sejam apenas por Amor,por Amor às nossas causas que quase sempre as pessoas ao nosso redor acham que são perdidas. Jaz aqui, uma ansiosa forte e decidida, por Amor às minhas tão queridas causas…PERDIDAS?

Tudo bem… Até pode ser

Que os dragões sejam moinhos de vento

Muito prazer… Ao seu dispor

Se for por amor às causas perdidas

Por amor às causas perdidas

 

* Este texto foi escrito em pedido a uma amiga, publicado no Facebook via nota, e no site MLD Quadrinhos, ao qual também escrevo.

Escritos de terminal de ônibus.

Saí hoje de meu trabalho com meus velhos fones de ouvido, viajando nos instantes das notas musicais. Gosto de atravessar a passarela da rodovia, depois de um dia cheio de trabalho. É uma forma de paz, de missão cumprida, não importando o tempo de mais ou tempo de menos que eu passei no meu trabalho. O simples fato de ter atravessado aquela passarela, significa que foi mais um dia de labuta. É uma forma de gratidão incontida, o vento batendo-me no rosto, os carros passando lá embaixo em velocidades variadas. Às vezes eu paro e fico olhando a movimentação, as luzes amareladas, a cidade no horizonte, e coloco-me a pensar no meu dia, nas minhas vitórias, meus fracassos, meu Amor, e também, nos dias que virão. Esses dias futuros, eu os encaro como uma probabilidade. Uma probabilidade que possa acontecer ou não, pois os dias futuros, na maioria das vezes é focalizado em nossas mentes pensativas, como um sonho a se realizar, e nós não temos controle nenhum no nosso destino, pois se fosse assim, acredito que ninguém teria dificuldades nessa vida, pois nós controlamos nosso destino. Ninguém quer ter o destino de morrer atropelado por um caminhão desgovernado. Essa coisa de destino, faz-me lembrar de minha avó, que está internada e em coma num quarto de UTI. Ela sempre nos dizia que passaria dos cem anos, porque ela vivia a base de feijão, farinha, banana, pinga e cigarros. E quando ela fosse morrer, ela não sentiria dor, pois ela morreria dormindo. Quem vai poder nos dizer, que ela sofreu?Depois de um AVC, pneumonia e infarte, logo levada inconsciente para o hospital, sem ter o poder de dizer o que sentiu…Teria ela, mulher de 75 anos, que nunca foi internada em uma hospital, realmente não sentido dor?

Confesso que tomo consciência, de que alguns dias nunca virão me saudar com o amanhecer na janela. São aqueles dias de utopia, aqueles sonhos que nós almejamos,. O que sabemos nós, meros mortais, meras incógnitas que não é compreendida nem por nós mesmos, o que nós temos controle do nosso destino?Mesmo que ele seja onírico, os sonhos que carregamos conosco nem sempre é realizado, ou quando são, não são iguais aos contos de fada. Sim, podemos nos surpreender? Pode ser algo que não imaginamos, ou algo melhor ainda do que achávamos que fosse, mas sempre, SEMPRE ficará a dúvida…Minha mãe sempre diz, que na dúvida, fique sempre com o benefício dela. Sejamos otimistas, mas um pouco de pessimismo é ter os pés fincados no chão. Temos que nos permitir delirar em sonhos, mas lembramos que para um sonho se realizar, temos que ter as raízes bem plantadas no solo, mas, árvores também morrem, mesmo aquelas que são regadas todos os dias. Talvez nossa luta, seja cega, surda e muda, nossos sonhos sejam apenas um escopo de projeto que chegou em deadline. Lutamos, lutamos, lutamos, mas a luta chegou ao fim. Vamos enterrar nossas espadas na pedra. Talvez vamos voltar mais tarde, retomar nossa luta, ou esperaremos que alguém retire a espada cravada na pedra da derrota, vamos esperar, tem pessoas que esperam, de braços cruzados, sem mover a bunda da cadeira. Vivem na comodidade de não fazerem porra nenhuma e se aproveitar do sonho dos outros. Enfim, é apenas mais um desabafo escrito à mão, num terminal de ônibus num bairro universitário suburbano.

Quando minha pele estiver enrugada, todos os meus fios de cabelo estiverem brancos, meus olhos, tão grandes e arregalados, estiverem miúdos e caídos, ainda lembrarei dos meus sonhos que eu tive em minha vida inteira, a não ser que eu esteja debilitada demais mentalmente. Eu penso que quando eu envelhecer, no fim dos meus dias aqui nesse universo, eu vou perder a senilidade, e não saberei mais o que escrever num editor de textos, minhas mãos talvez irão tremer, e eu mal conseguirei segurar minha caneta. Eu terei um mundo esquizofrênico ou um mundo sem memórias, não reconhecerei os olhos das pessoas que eu amei ou amarei em vida. Uma vez eu ouvi uma frase, que dizia que a Morte, quando se aproxima, nos priva primeiro daquilo que mais amamos. Eu amo escrever…Talvez eu perca isso um dia, algo me privará daquilo que eu amo tanto. Penso que um dia, não terei mais a eloquência suficiente para escrever o que eu penso. É uma sensação que levo comigo, pois eu gasto tanto minha mente com minha hiperatividade, que por instantes é acalmada com um comprimido de Rivotril de meio miligrama, e mesmo com ele, nas noites que eu não consigo desligar-me de minha tempestade de ideias e indagações, ele me dá sono, e no sono meus pensamentos são transmutados para os sonhos, nas minhas poucas horas de sonhos, eu, inconscientemente ainda não atingi a minha paz.

Eu sou intensa demais para deixar uma palavra ou várias delas, passarem batido, despercebidas. Eu sou mulher demais para confessar que eu amo mesmo não tendo certeza sobre o outro lado da moeda. Isso não me mata, pelo contrário, me fortalece. Aquele que se cala perante meu turbilhão de indagações, tagarelices, loucuras e momentos de “sensatez insensata”, é aquele que me cativa. Eu gosto daquilo que me é contrário, pois me completa no sentido de me ensinar aquilo que eu não tenho. Não costumo ser silenciosa, logo uma alma silenciosa faz-me aprender a ser mais contida e menos verborrágica, no sentido não de escrever menos, mas de conversar com os olhos, sem ter que cuspir um milhão de palavras. “Dê tempo ao tempo “, sempre diz a minha amável e sábia mãe. Eu tento, desengonçadamente, não contar as horas, minutos e segundos para o alvorecer de um sorriso. A Vida ensinou-me a Amar tudo aquilo que eu carrego nela. Se a solidão e o silêncio andam comigo, de mãos dadas, eu abraço a decisão de que não poderia ser melhor, mas tenho sã consciência que a Vida é uma caixinha de surpresas, e muitas vezes nossas convicções são traídas com um belo tapa na cara, e uma cara de surpresa. A vida é uma incógnita, um sistema escalonado sem solução…Ela é bipolar, nos abraça com suas maravilhas de instantes, mas nos dá chicotadas nas costas, e elas podem ser cruéis, muito cruéis, somente o Tempo e sua Sabedoria poderão curar nossas feridas.

Eu seria muito imbecil se eu acreditasse que poderíamos ser felizes o tempo inteiro, que o Amor sempre será mútuo, que teremos um Amor para a vida toda. Nós vivemos num mundinho que instalou a cultura de que tudo é descartável. Eu acho lindo, aqueles casais de idosos que estão juntos desde a mocidade, um acompanhando as derrapadas e vitórias durante tantos anos. Minha avó diz, que o segredo das pessoas que vivem juntas por muitos anos, é que elas não tratam as pessoas como coisas descartáveis. Se há uma briga no casal, a primeira coisa a se fazer não é pedir divórcio, é sentar e conversar, e não jogar fora como um brinquedinho de plástico. Em falar em divórcio, via a dois e tudo mais, eu sou uma mulher que não tem o sonho tão clichê e simbólico de casar numa igreja e fazer uma mega festa. Hoje, o casamento é uma instituição falida. Sou partidária que não há problema algum, juntar as escovas sem casamento. Se um dia, eu for casar, se isso for realmente necessário, será uma cerimônia bonita em um cartório, e depois um churrasco para os mais chegados. Não quero gastar com festas e tudo mais. Prefiro guardar a grana que gastaria para um casamento, para usar numa lua de mel. Prefiro gastar meu dinheiro em noites tórridas de sexo na Europa, do que encher a pança de pessoas que sairão reclamando da festa, e depois eu terei boletos e boletos pra pagar. Desculpem-me as mulheres sonhadoras de véu e grinalda, isso apenas é uma opinião minha, e confesso que muitas vezes eu gostaria de ser mais “normal”, ter aquela coisa de casar na igreja, agradar meus pais, avós católicos, mas não é meu ideal de vida. Eu faço aquilo que é melhor, se meu parceiro, aquele que me acompanhará não faz questão de casamento, ótimo. Eu sempre digo que conheço casais que não são casados, mas que possuem mais sinceridade e amor mútuo do que muito casal com aliança grossa no dedo. A hipocrisia impera neste mundo, aquele que lhe diz que você errou por não ter casado, tem um casamento infeliz.  Pode apostar que o divórcio está chegando em galopadas de guerra.

Antes só do que mal-acompanhada. Eu sempre acreditei neste ditado. Acostumei meus olhos e instintos que viver sozinha é uma forma de aprendizado e auto-conhecimento. Mas eu digo, que quando eu amo alguém, eu não a trato como uma coisa de plástico. Não é como na música “Fake Plastic Trees”, do Radiohead. Eu não amo um homem de plástico. Pessoas possuem sentimentos, não gosto de brincar com eles, e eu também não sou uma mulher de plástico. Sou feita de emoções, sensibilidade, Amor, ódio, raiva, tristeza. Toda mulher carrega com ela todos os sentimentos do mundo, o homem também. Somos feitos de um conjunto de sentimentos, e alguns nunca sentiremos na vida, se não houver um estopim, um tiro, um ponto de partida, um insight…

Enquanto eu caminhava pelo terminal de ônibus, eu estava pensando em meus projetos para o futuro. Eu gostaria de ter uma casinha simples e linda, com um quintal agradável, com flores, árvores e bichos correndo pelo quintal. Eu amo os animais, sua pureza de espírito e seu amor incondicional. Se for um apartamento, pode ter um dormitório só, mas que tenha uma sacada para que eu possa escrever sentada numa cadeira confortável, e quando me erguer e parar com a cabeça apoiada nas mãos, observando a vida miúda e interessante lá de baixo, que eu possa divagar sobre a vida e os acontecimentos daquilo que eu vejo. E terá somente o silêncio de meus pensamentos, que serão também daquele que estender-me a mão algum dia.

Quero eu, ao envelhecer, ter meu velho Amor ao lado, com um sorriso talvez banguela, de bengala, ou com uma dor nas costas típica daqueles que levaram as dores do mundo nos ombros, durante a juventude. Este meu velho, nos meus sonhos de velhice, estará ao meu lado, na alegria, na tristeza, na raiva, na pobreza, na riqueza, na vida e na morte. E ele olhará para os meus olhos, tão calejados perante as surpresas agradáveis ou não que a vida nos proporciona, ele olhará pra mim, teremos um cachorro cego, surdo, velho e gordo deitado aos nossos pés, as folhas cairão tímidas lá fora…Ele olhará em meus olhos, me dará um sorriso de velho, e me dirá: “Você se lembra quando…”

Quando a velhice chegar, aceita-a, ama-a . Ela é abundante em prazeres se souberes amá-la. Os anos que vão gradualmente declinando estão entre os mais doces da vida de um homem, Mesmo quando tenhas alcançado o limite extremo dos aos, estes ainda reservam prazeres. Sêneca
Quando a velhice chegar, aceita-a, ama-a . Ela é abundante em prazeres se souberes amá-la. Os anos que vão gradualmente declinando estão entre os mais doces da vida de um homem, Mesmo quando tenhas alcançado o limite extremo dos aos, estes ainda reservam prazeres. Sêneca

A imoralidade mora no céu…E no coração dos homens.

Este texto é a coisa mais imoral que eu já escrevi. Eu sou humana, fraca, eu tento resistir à tentação, mas ela é mais forte do eu. Eu não sou um eco de ninguém, apenas permito-me escrever um fluxo de pensamentos, um fluxo de coisas que fazem parte da minha tão simples vida. Sim , eu escrevo sobre a vida, eu adoro metáforas, eu acho a sutileza algo extremamente elegante. Eu demorei muito para escrever essa metáfora sobre o Sol e a Lua, entre outras coisas da Terra, eu terminei de escrevê-lo eram três horas da manhã. Fiquei por minutos, pensando se valia a pena publicá-lo ou não. Publiquei primeiramente no meu outro blog, que um grupo de escritores e ilustradores. E por que, você se pergunta, que eu fiquei por tempos pensando se publicava ou não? Porque este texto pode ser considerado muito, mas muito, absurdamente imoral. Mas este texto tem alma própria, é bonito, sensível, e se eu pensei em alguém pra escrever isso, não é porque não tenho idéias próprias, mas a partir do momento que algo entra em nossas vidas a ponto de refletirmos sobre nossas atitudes, razões, emoções, que nos traz um sorriso mais largo, enfim, não creio que seja imoral. Pode ser um tentação irresistível, claro, pode mesmo, e o que nos resta, como seres humanos, é quando não podemos vencer nossas convicções, nos entregamos ao pecado. E teria outro jeito? Renunciar, talvez, eu sou teimosa, odeio renúncias, sou uma eterna errante, eu não nego e não renúncio, eu luto até o fim. Não sou de renunciar sentimentos, já machuquei-me muito por ser assim, mas creio que tudo nesta vida vale a pena, tudo nós levamos como uma lição, e não devemos deixar de correr riscos. Sigo por aí, traindo minhas convicções, pecando, mas não deixo de ser única, ter virtudes reais, sentimentos intensos, ideias e pensamentos que voam como uma folha na fúria de um vento. Se deixo-me inspirar, é porque permito-me olhar o que há de Belo nesta vida, e eu não falo só de lindos olhos azuis e um sorriso. Existem muitas coisas além disso,  muitas coisas além do que os nossos olhos enxergam. Somente a Beleza não me basta, é preciso que toque meu coração e que me tire completamente da toca. São bem poucos, não passa nem de uma mão, se eu contar nos dedos, as pessoas que me fizeram crer que nem tudo está perdido. Sou uma eterna errante, tal como Dom Quixote, estou sempre em busca de causas perdidas.

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Este texto que vem logo abaixo é um conceito. Deve ser lido como uma fantasia, um sonho, uma metáfora. O Sol, a Lua, como dois apaixonados, trocando mensagens entre si.  Quem sabe, você, querido (a) leitor (a), leia este texto pensando na pessoa amada, mesmo que ele (a) não esteja anos luz de distância, mas sempre, ao amanhecer, no pôr do sol ou numa noite de lua cheia, quando olhar para o céu, é o sorriso desconcertante do ser amado que lhe surge  na memória. O amanhecer e os primeiros raios da manhã que nos aquece, o entardecer e os raios alaranjados do Soberano Sol, a Lua com suas fases…Todas esses fatores “astronômicos”, influenciam não só o movimento das marés do oceano, mas também os sentimentos e pensamentos dos homens e mulheres na Terra. Já dizia Lord Henry, em “O Retrato de Dorian Gray”, livro de Oscar Wilde:

– Não existe boa influência – respondeu Lord Henry. – Toda influência é imoral – imoral do ponto de vista científico -, porque influenciar uma pessoa é dar-lhe sua própria alma. Ela já não pensa com seus próprios pensamentos nem sente suas próprias paixões. Suas virtudes não são reais para ela. Seus pecados, se existem tais coisas, são emprestados. Torna-se um eco da música de outra pessoa. O objetivo da vida é o autodesenvolvimento. Cumprir a própria natureza perfeitamente – essa é a razão por que estamos aqui. As pessoas têm medo de si mesmas, hoje em dia. Esqueceram-se de seu principal dever. Claro que são caridosas: alimentam os famintos, vestem os mendigos. Mas suas próprias almas morrem de fome e estão nuas. O terror da sociedade, que é a base da moral, e o terror de Deus, que é o segredo da religião, são as duas coisas que nos governam. Mas eu acredito que se um homem vivesse sua vida completamente, desse forma a todo sentimento, expressão a todo pensamento, a realidade a cada sonho, acredito que o mundo ganharia um impulso novo de alegria. Mas o mais corajoso dos homens tem medo de si mesmo. Cada impulso que lutamos para estrangular aninha-se na mente e nos envenena. O corpo peca uma vez e não tem nada mais a ver com o pecado, pois a ação é um modo de purificação. Nada permanece, a não ser a lembrança de um prazer ou desgosto. A única maneira de se livrar de uma tentação é entregar-se a ela…

Quando o Sol ou a Lua não aparecem, é porque estão cansados de ser a inspiração e influência amorosa dos seres da Terra. Eles se entristecem de tal forma, que se escondem por trás de nuvens. Por vezes, a lua fica minguante, ela quer mostrar apenas uma parte da sua saudade, mas ela é amada mesmo assim. Nós, humanos, entregamos todas as nossas tentações e pecados embaixo do calor de uma estrela imponente, e fazemos declarações sob o Luar.

Espero que gostem, e que ao terminarem de ler este texto, pensem na pessoa amada, mandem uma mensagem dizendo “Eu te amo”, ou dizer que está com saudades, e agradeça, de alguma forma, por essa pessoa ter surgido em sua vida e iluminado seu sorriso e razão de viver. E se você, querido (a) leitor (a), que ama alguém, e a pessoa não saiba disso, meu amigo (a), eu digo-lhe que a vida é muito curta para não tentar. Não se vive sem correr riscos, lembrem-se disso. Obrigada e boa leitura!

Prólogo.

– No começo existia apenas a escuridão. Então surgiu o sol, seu nome é Guaraci. Um dia ele ficou muito cansado e precisou dormir. Quando Guaraci fechou os olhos, tudo escureceu. Então, para iluminar a escuridão deixada por ele, enquanto ele fechava os olhos por longo período de tempo, ele criou a lua, e lhe deu Jaci, de alcunha. Ele Guaraci, criou uma Lua tão bonita que imediatamente apaixonou-se por ela. Encantou-se de uma forma tão intensa, que o seu brilho a ofuscava, como se ela estivesse assustada perante tal intensidade de seus raios de sol. Ela, Jaci, era uma menina desajeitada perante o brilho inebriante do Sol, e este, um menino desajeitado perante a intensidade da Lua. A Lua desaparecia tímida, quando o Sol aparecia. Guaraci criou, então, o Amor, deu-lhe o nome de Rudá, e este era seu porta-voz. O Amor até então, a única coisa que ele conhecia, era a Luz ou as Trevas. Não importando as estações do ano, a passagem do tempo, o momento, não importava nada… Rudá sempre podia dizer a Jaci o quanto Guaraci, o rei soberano, era apaixonado por ela. Vendo que a Lua estava sempre sozinha, Guaraci criou também companheiras para ela. Deu-lhe o nome de Estrelas, elas tornaram-se então, suas irmãs. O rei soberano, enquanto dormia, não queria que sua amada ficasse sozinha. Os dois se amavam, apesar de toda distância. Guaraci ama tanto a Jaci, que lhe deu seu brilho e calor enquanto dormia.
De tempos em tempos, os amantes se tocam… E quando eles transformam-se em seres únicos, mesmo na efemeridade deste encontro, visto à unidade de tempo do nosso universo, o Amor, a maneira de como um toca o outro, se torna única. E foi assim, segundo os indígenas, que tudo o que existe quando olhamos o céu, é fruto do Amor de Guaraci e Jaci.

Cartas ao meu Rei Soberano

Esta noite eu me lembrei de você. Não sei por que exatamente escrevo-lhe “Esta noite”, pois você sabe que todas as noites, aqui no nosso céu, você sabe que eu penso em você e que eu posso sentir seus raios me aquecendo mesmo em noites de inverno, mesmo quando as nuvens me encobrem, quando eu me sinto cansada da contemplação dos seres humanos, quando o uivo dos lobos, e o miado dos gatos que namoram nos telhados ou em árvores, enfim, estes sons me enlouquecem e por momentos, meu Amor, eu quero ficar surda. Quero apenas que me toque, e que me aqueça ainda mais. Quero que olhem nosso Amor, e fiquem todos cegos. Alguns humanos, eu percebi, ficam acanhados perante um casal que se ama, os que estão solitários, olham pra mim e me pedem uma paixão, um Amor, alguns, sofrem, platonicamente, e me pedem que lhe trague o ser amado ao qual amam à distância. Eu posso ver o amor platônico deles rolando numa cama iluminada pela minha luz, mas nesta Terra, os humanos acreditam em algo que eles chamam de Esperança. Eu também, todas as noites, eu tenho algo bem semelhante a este sentimento dos terráqueos, seria também, Esperança? Amor, meu rei soberano, queria que o Universo adiantasse nosso encontro. Eu sinto muitas saudades, mesmo você deixando em mim todo o teu calor, eu sinto uma saudade extrema do momento efêmero de deitar-me em teu peito.

Esta noite, quando olhei lá embaixo, num bairro de subúrbio qualquer, eu encontrei uma flor chamada Girassol, dizem por aí que ele é UM flor, e não UMA flor. Ele é lindo, imponente, de uma beleza que o nosso amigo Tempo me contou que é como um verbo que não se conjuga. Alguns humanos se calam perante a Beleza do Girassol, outros dizem, o quanto é belo, tão belo quanto tu. Outros humanos, dizem que seus amados possuem a mesma beleza e sentimentos do Girassol. Um lobo me contou, que o Girassol, em dias chuvosos, murcha e coloca-se a olhar para os pés, tímido, como se estivesse acuado, ou se a chuva trouxesse a ele todos os tons de cinza que ela carrega. Ele, Girassol, agradece pelas gotas de chuva que caem aos pés, se sente pleno com a água escorrendo nas pétalas, mas ele sente falta do teu brilho, sente falta do teu calor aquecendo-lhe as pétalas. Quando você o aquece e ilumina, ele fica altivo e contente.

O lobo contou-me também, que o Girassol também gosta do silêncio. Ele pede para aqueles que pousam em seu ombro, que respeitem seu Silêncio. O Girassol é de poucas palavras, o Silêncio que ele carrega, é como um belo poema. O Girassol se fosse um ser humano, como os homens que caminham na Terra, ele amaria com olhos.

Alguns pássaros pousam nele e comem as sementes que saltam de seu miolo. E ele não esbraveja, sente-se feliz, e um dia, ele finalmente morre. Mas alguns pássaros, distraídos, deixam algumas sementes caírem ao chão.  Depois de alguns dias de chuva, outros dias iluminados com tua Força, Beleza e Calor, outro Girassol surge, mas, todos os Girassóis, me disse o Lobo, ficam extasiantes diante de ti. Eu confesso meu Amor, eu senti uma ponta de ciúme desta flor, pois ela está lá, sempre lhe contemplando, isso me perturba um pouco, pois sou eu, a sua Dama, aquela que lhe espera, sempre nova, para poder me aconchegar-me no teu peito, encher-lhe de beijos, e sussurrar meu êxtase nos teus ouvidos. Mas eu percebo, que da mesma maneira que aparentemente o Girassol lhe contempla, ele também me observa nas noites de minha estação nova ou cheia. Ele me olha, nos olhos, parece que quer me dizer algo, mas não consegue. É como se o Silêncio que ele carrega timidamente, fosse uma forma de aplauso. A Beleza do Girassol me deixa extasiada, por lembrar tanto você, as pétalas do Girassol, lembram-me teus raios, que me envolvem naquele momento que eu tão espero.

Eu te amo meu Amor, eu sei que já lhe escrevi isso, durante toda a nossa existência. As nuvens me dizem que você também sente saudades, que quando fecha os seus olhos e eu abro os meus, é comigo com quem sonha. Peço-lhe meu querido, toda a calma do universo. Eu, sempre mais expressiva, talvez porque os humanos, uma espécie de humano que eles chamam de “Poetas”, dizem que eu tenho alma feminina, que sou como as mulheres na Terra, porque elas, assim como eu, são cheias de fases, mas todas elas querem um abraço, o calor de um homem, que neste caso, dizem por aí, estes mesmos “Poetas”, que você, meu Sol soberano, é como o Homem, pois é de poucas palavras. Você gosta do Silêncio, eu sou verborrágica. Rudá entrega-lhe minhas mensagens em muitas linhas, você é tão calado que sinceramente eu lhe digo que teu silêncio por vezes me corrói. Eu me preocupo contigo, eu sei que estás aí, brilhando alto e imponente, que às vezes, como o Girassol, se esconde encolhendo-se em dias de chuva. Mas você não é sempre assim. Uma coruja buraqueira contou-me, que um dia, estava chovendo, e ela estava tomando um banho no toco de uma cerca na beira da estrada. E você apareceu, no meio da chuva, e fez uma coisa que os humanos chamam de arco-íris. Mas, ela disse-me que você chora toda vez que faz isso, ao entardecer. E você, em seu silêncio, nunca me contou.

Enfim, saiba meu Amado, que enquanto você estiver vivo, radiando seu calor, em Silêncio, eu sei que está por perto, pois eu sinto teu calor toda vez que eu acordo, e ele me lembra do dia em que eu me deitei em teu peito. Fique bem, pois aonde quer que esteja o meu pensamento eu levo junto a ti. 

Cartas do Rei Soberano para sua Rainha.

Olá, tudo bem? Andei muito ocupado. Alguns humanos estão construindo centros que captam minha energia. Chamam isso de Energia Solar, inserido num contexto que eles chamam de sustentabilidade. Eles me sufocam, e eu também os sufoco com o meu calor. Mas eles estão me sufocando tanto, que qualquer hora vai ter daquelas minhas tempestades solares. Ando muito cansado. Desculpa se eu não falo muito contigo. Sabes tu que eu gosto do silêncio, eu não tenho toda a sua intensidade, entenda, este é o meu jeito de ser.

Eu tenho uma surpresa pra você, estive conversando com tal de Deus, e ele me disse que há muito tempo atrás, ele criou uma espécie de flor que se assemelha a mim. O nome dela é Girassol, ele tem minhas cores, é calado. Tu já deves ter olhado para ele, e se sentido estranha alguma vez. Deus me confessou que fez à minha imagem e semelhança, algo que os humanos chamam de metáfora. Conhece essa palavra?Achei-a bem bonita, ME-TÁ-FO-RA, lindo não é? Deus disse que esta flor, fica imponente com meus raios, e quando eu vou dormir, este tal de Girassol fica na terra, e quando você aparece, ele contempla-lhe, e de uma maneira simbólica, “metaforicamente” falando, aquela flor ali, sou eu olhando pra ti. Deus é tão sacana, depois de bilhares de anos, ele foi-me contar isso só agora. Aquele Girassol é um mimo pra você, se você o olhar, e amá-lo, é a mim que está contemplando. Quando eu acordo, o Girassol sempre me fala que você estava linda, com suas manchinhas. Desculpe-me falar disso só agora, eu ando meio esquecido. Eu sempre esqueço as coisas, esses dias eu esqueci um dos meus neutrinos no espaço, achei até que havia esquecido, porém, desta vez eu encontrei.

Esses dias foram chuvosos, eu não apareci no céu, mas tentei pela bilionésima vez deixar um presente pra ti. Eu sou teimoso, eu sei que talvez não vá dar certo nunca, mas eu não desisto. Um dia você vai acordar, e a noite irá nascer duas vezes pra ti. Quando chove, eu saio timidamente da minha toca, e tento criar junto com minha amiga Chuva, um arco de sete cores. Você me disse que gosta de cores, e eu vejo sua alma assim, cheia de cores, nuances. Mas eu fico triste, pois esse arco é efêmero, quando chega o entardecer, ele some. Se você pudesse ver a Beleza dele, se encantaria. Eu sei, eu já lhe disse que a influência é imoral, mas se você pudesse ver o arco-íris, seria tão lindo. Estarei eu traindo a minha convicção?Eu acredito que não poderia ser melhor, mas eu confesso, eu sou como o Homem lá na Terra. Dizem os humanos, que o homem perante do que é belo e caótico, sente-se como um menino desajeitado. Eu não lhe prometo a mesma intensidade verborrágica, não tenho a mesma coragem que tu. Meus instantes, talvez sejam mal traduzidos, mas é minha forma de ser. Peço que releve isso. Boa noite querida.

A loucura das quatro estações – Parte 2

Quero apenas cinco coisas.. Primeiro é o amor sem fim A segunda é ver o outono A terceira é o grave inverno Em quarto lugar o verão A quinta coisa são teus olhos Não quero dormir sem teus olhos. Não quero ser... sem que me olhes. Abro mão da primavera para que continues me olhando.                Pablo Neruda
Quero apenas cinco coisas..
Primeiro é o amor sem fim
A segunda é ver o outono
A terceira é o grave inverno
Em quarto lugar o verão
A quinta coisa são teus olhos
Não quero dormir sem teus olhos.
Não quero ser… sem que me olhes.
Abro mão da primavera para que continues me olhando.
Pablo Neruda

Despiram-se, como árvores que perdem as folhas. Insanamente, começaram a se amar, ali, no chão. Eram todas as cores juntas, misturadas, o sexo tem cores, e elas se misturam, e era nisso que eles acreditavam. Um sexo cinza é broxante, tudo deve fluir, as cores das peles juntas e suadas, os fios de cabelos, o toque, os gemidos. Sexo é sinestesia. Tudo em cores de outono, olhando de cima, um casal se amando entre as folhas. As cores do lençol que se misturavam quando ele a levantou e a carregou para o aconchego daquela cama simples. Era uma cama velha, mas bem arrumada e com lençóis bonitos. A lingerie vermelha largada ao chão era como uma rosa, uma rosa que floresceu em pleno outono. Para as rosas, não existem estações, não existe o Tempo. A rosa é uma flor a frente do seu tempo. Ela floresce quando bem entender, debaixo dos raios de sol escaldantes de um verão tempestuoso, com suas chuvas de finais de tarde, florescem no outono resmungão, rabugento com seus ventos, exalam sua beleza e perfume no inverno que nos arrepia a pele e nos convida para perto do fogo, e na primavera…bem, na primavera a Rosa floresce sem a mínima vergonha. Ela se abre, se deixa envolver, suas pétalas são suaves, e sua beleza é eterna, mesmo estando secas guardadas dentro de uma garrafa de vinho sobre a mesa. Pessoas deviam ser como rosas, sem tempo ruim, devemos nos permitir crescer e desabrochar como as rosas. As rosas tem espinhos…Sim caro leitor, toda rosa tem seu espinho, ao espetar seus dedos, você pode gritar de dor, ou levar o dedo a boca e sugá-lo levemente, como uma criança suga os peitos da mãe, como um amante beijando os mamilos de sua amada. Nós podemos levar nossas loucuras, erros e tropeços com agressividade ou suavidade. Podemos sair esbravejando feito vento matutino de uma manhã de outono, mas basta nos proteger embaixo de nossos agasalhos de razão e bem senso. É fácil falar, é fácil escrever?Não não é…Escrever é como o outono. Você fica embaixo de uma árvore e espera que tua folha de inspiração caia em teus pés, mas a vida não funciona desta forma. Muitas vezes temos que ter força suficiente para pegar uma escada e buscar nossa inspiração antes que ela caia aos nossos pés, e vale lembrar, algumas folhas nunca caem, e quando caem, é de uma tal brevidade que o gari já a levou embora e agora ela é queimada numa fogueira. Não vamos perder tempo, vamos contemplar o outono e apanhar nossas folhas antes que elas voem longe com o Tempo, e isto não é loucura, isto se chama saber viver. Quanto as folhas de outono caírem e emaranharem-se em meus cabelos, tire-a com a suavidade de uma rosa, mas vamos fazer amor com a intensidade de um vento de outono, com a beleza de uma tempestade, que seja um sexo quente como o verão, que nosso carinho um ao outro seja suave como a primavera, mas que ao mesmo tempo nos permita a selvageria de uma nevasca em terras europeias  e que esteja ao final,  nossos corpos arrepiados o bastante para nos abraçarmos.

Repara que o outono é mais estação da alma do que da natureza.
Nietzsche

Vou me embora…para a Paulicéia Desvairada?

Nesta semana eu ouvi um relato de um homem que estava pedindo dinheiro no ônibus para voltar para sua terra. Ele estava com a mulher e a filha. Naquela idéia de conseguir algo melhor para ele e sua família, ele vendeu tudo o que tinha para tentar a sorte na cidade grande. Primeiramente tentou em São Paulo, e depois mudou para Campinas, onde fez vários serviços de “bico”. Depois de ser expulso duas vezes e não ter condições de viver por aqui, juntou tudo aquilo que lhe restou e estava juntando dinheiro para voltar para Caetité, na Bahia. Sendo assim, por causa disso que escrevi esse texto, na verdade um ensaio, sobre o grande inchaço das cidades e a luta dos imigrantes de outras regiões para uma vida melhor. Como dizem por aí, “não tá fácil pra ninguém!”

Severino e sua família decidem se mudar para a cidade grande. Severino trabalha no campo e decidiu vender tudo e partir para o que ele chamava de “vida melhor”. Essa história se repete todos os dias, com vários e vários Severinos, desde meados dos anos 20, na maioria dos países emergentes, é o que chamamos de urbanização. A realidade é bem triste: sem especialização, semi ou completamente analfabetos. A ilusão de que as grandes cidades possuem o status do “poder”, emprego abundante, qualidade de vida, entre outros fatores, fazem com que essas pessoas abandonem suas cidades em busca de melhores condições. Depois que chegam, abrem os olhos e choram lágrimas de desgosto, em seus barracos na beira de um córrego fétido ou num cortiço de condições e dignidades mínimas, em algum bairro decadente da cidade.  Na favela do Paraisópolis, os Severinos são observados com desdém pelos olhos dos ricaços na sacada do apartamento duplex ou triplex de milhões de reais. Sendo assim, além de tudo pelo o que passam, são marginalizados pelo resto da população.

O inchaço urbano nas cidades europeias, surgiu no final da idade média. Com a queda do Feudalismo e o surgimento do Capitalismo Comercial, os antigos “servos” desprenderam-se da terra e partiram rumo às primeiras cidades europeias denominadas “burgos”, antes comandadas pelos senhores feudais, substituídos pelos comerciantes e banqueiros, a chamada burguesia mercantil e financeira. Os camponeses expulsos da terra e os artesãos arruinados por terem perdido os meios de produção, passam a vender suas forças de trabalho nas manufaturas, que se tornaram no auge do Capitalismo Industrial, fábricas “à pleno vapor”. Enfim, o Capitalismo torna-se financeiro: bancos, cartéis, trustes, multinacionais, cotações, bolsas de valores, especulações, tudo concentrado nas grandes cidades. O Capitalismo, desde os primórdios de sua existência é uma semente que deu origem à uma grande árvore, cujo fruto é o lucro. As raízes, o caule e os galhos são todo o conjunto de uma grande cidade com seus meios de gerar dinheiro. Os trabalhadores compreendem a seiva elaborada. O processo no Brasil é mais demorado, pois o Capitalismo Industrial demorou para fixar suas raízes, logo, a expansão das cidades ainda é visto como algo muito recente.

A segregação espacial dessas grandes cidades é tão cruel quanto o sistema capitalista, e não há como fugir disso, já que os novos habitantes, de terras longínquas, não dispõem de meios para conseguir uma moradia digna. Com o crescimento das cidades, novas áreas vão surgindo, e consequentemente ocorre a desvalorização das áreas mais antigas, que serão ocupadas por pessoas com menor poder aquisitivo, formando os famosos “cortiços”, ocupados por inúmeras famílias, espremidas em pequeno espaço e condições precárias de infraestrutura. Também há a ocupação de terrenos abandonados em áreas de risco, o aumento da violência gerada pela desigualdade social e desemprego, o crescimento do crime organizado, associado ao tráfico de drogas e a ineficácia da polícia e do Poder Judiciário. Não podemos esquecer dos problemas ambientais causados pelo crescimento das cidades: erosão do solo, poluição atmosférica, poluição dos mananciais e o acúmulo de lixo devido a falta de espaço para um aterro sanitário.

E assim, o sonho de muitos Severinos e Severinas ou de qualquer outro indivíduo de qualquer outro lugar do nosso país, que se diz a todo momento ser um “país de todos”, despencam em um abismo da realidade social e estrutural do espaço urbano. O crescimento sem fronteiras dessas cidades e a falta de investimento nessas áreas precárias, faz nós revermos os nossos conceitos de “cidade grande, vida boa”. Se antes, a maioria dos “Severinos” pensavam, “vou-me embora para a Cidade Grande, pois aqui eu não sou feliz”, ao chegar na “Paulicéia Desvairada” de Mário de Andrade, lembram-se tristemente que “na nossa terra tinha palmeiras, onde cantava o sabiá”.