Prosa de um sábado chuvoso.

Contra o céu de amanhã, vamos todos padecer de cansaço. Estou deitando sozinha em um gramado macio, vendo as nuvens passearem pelo céu, dou a cada uma delas uma forma de algodão doce. Eu gostaria de poder pegar e sentir a doçura de cada uma das formas tão abstratas que vejo neste céu que entoa um poema desmistificado perante meus olhos. Queria um beijo sincero, enquanto as nuvens de algodão dão seus sorrisos de Salvador Dali, um surrealismo, nessas horas que eu te adoro, e que eu apenas acho que cairemos, e como crianças feridas perante as peças de tragédias, dramas e comédias, nós vamos correr para nossos esconderijos, e cuidarmos um do outro, apenas com nossos sorrisos abstratos, nossos lábios se tocando na graça das horas… Horas melancólicas,  úmidas… Na penumbra, seremos dois adultos, com coração de criança, me dê um sorriso teu apenas com os olhos.
E eu penso, em todo o Amor que nos cerca, como humanos errantes, caminhando em trilhas tortuosas, cheias de espinhos, mas com sua beleza, escondida, em cada momento, no abraço, no sono, em nosso cansaço. E eu pergunto-me se ficaremos bem, com a humanidade abstraindo sentimentos, procurando uma glória talvez inexistente, em dias e coisas vazias, caminhando sem rumo, com olhos cegos, apenas um carro de última geração na garagem, uma televisão de polegadas e definições cada vez maiores. Enviamos glórias, uma oração, mãos juntas, os anos trazendo lembranças no galope da saudade, um sentimento aflito, oras tão devagar. Já contei por horas perdidas o quanto a saudade fez-me escrever linhas e linhas de palavras insones e por vezes apenas um eco entre eu e meu interlocutor, uma mensagem que apenas, na sutileza dos acontecimentos, será capaz de entender.

Somos todos, talvez, pobres tolos sem rumo, quem somos nós, meu Doce Amor, caminhando devagar, tão pequenos, julgando aqueles que se deixam molhar na tempestade por puro orgulho. Por isso eu vos digo, vamos esperar no fogo de nosso sentimento, coerência, incoerência, enfim, por tudo aquilo que nos move, em passos aturdidos, pobres dançarinos, passos desajeitados, mas tão belos em nossas tentativas de compreender a música enlouquecedora que ecoa, muitas vezes, sem querer. Vamos beber, enquanto nossa partida demora, a chuva está caindo lá fora, serena, molhando os carros, pessoas, cães abandonados. Fecho os olhos, e penso que as nuvens negras do céu nunca atingirão o meu chão, e os relâmpagos que trazem depois de alguns segundos, o estardalhaço de um trovão, eu penso apenas em alguma verdade perdida há alguns segundos, minutos atrás. E nós, Amor doce, estaremos acordados quando nossas almas questionarem a carruagem do Tempo, com todas as suas perguntas sem respostas?

Seremos crianças acordadas, com medo do escuro, minha doce criança malcriada, quando você se cala,  eu penso nos momentos em que cairá no chão, aturdido, e dará um suspiro, de satisfação, por todo esforço que valeu a pena. E eu cuido de você, toda noite, todos os dias, no silêncio quase descontente, minha distância de poucas milhas, distância…

Olho para as estrelas procurando respostas em um brilho do passado, talvez um brilho ao qual nem exista mais, teus olhos tão distantes, mas que me deixam tão completa, queimam vestígios de toda rabugice que eu levo neste meu coração. Os sinos da igreja tocando uma velha canção, gosto dos sinos tocando, da tarde caindo, de meus beijos de despedida. Eu poderia te cobrir com beijos de conhaque ou outra coisa que lhe aquecesse, sua beleza insólita, me apertando nos braços, não me deixe partir, dê-me um milímetro de teu sorriso desconcertante, pois eu ando na contramão, sigo minha rota de olhos fechados, por isso, segure minha mão quando me ver atravessar a rua, pois eu atravesso minhas emoções do mesma forma que eu sinto as areias do tempo escorrendo entre meus dedos, e saiba minha doce criança, que eu ando ao final de uma longa avenida, e nos meus passos de mulher com olhos oblíquos, você é sempre suave e persistente em minha memória. Doce criança, eu te adoro…Doce criança, lembre-se disso.

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